NA OCA
Trata do modo de vida das populações indígenas, seus conhecimentos e visões acerca do mundo, cultura e religião, oriundas de ocupações seculares das terras amazônicas, cultivando seu equilíbrio ecológico.
As mulheres da etnia Munduruku têm suas próprias práticas para o parto A etnia Munduruku preserva crenças e rituais que são marcados, por exemplo, quando as mulheres dão à luz. A pesquisadora Raquel Dias Scopel evidencia na sua tese os saberes indígenas nas percepções da saúde do feto, na escolha dos locais para acontecer o parto e como o povo acredita que o embrião humano se forma.
Raquel ressalta na sua pesquisa que, do ponto de vista dos Munduruku sobre a gestação, o sangue menstrual da mãe e o sêmen do pai são os formadores do feto. A menstruação é vista como método contraceptivo entre eles, daí a relação sexual ser evitada nesse período. O uso dos remédios caseiros também é acionado para reduzir o fluxo da menstruação. A formação do feto não se limita apenas ao contato fisiológico, a mãe e o pai precisam cuidar do bem estar dele durante a gravidez e, depois, em toda a infância. Além disso, também é comum o pai ficar abatido com sintomas de fraqueza, mal-estar e enjoo. Em entrevista ao Ateliê Amazônico, Gabriella Soares, estudante de História na Universidade do Estado do Amazonas, por meio do WhatsApp, comenta que seu Trabalho de Conclusão do Curso (TCC) tem o enfoque na vivência nas comunidades Munduruku e que também inclui a gravidez das mulheres. Na sua pesquisa Gabriella afirma: “A forma que as mulheres se comportam durante a gravidez, que na verdade todas as etnias têm essas similaridades, tem sido um assunto muito extenso e simbólico ao longo do tempo, a maneira de lidar através de ritos e crenças sobre a prática da chegada de uma nova vida ao mundo”. No processo do parto as mulheres podem escolher a posição que desejam ficar: de joelhos, com as mãos apoiadas na rede; deitada ou sentada no chão com alguém segurando, pelas costas, com os braços ao redor da parturiente; ou “sentada” em um banquinho. Quando o bebê nasce é amparado pela parteira. Além disso, acredita-se que a água quente pode ajudar a prevenir infecções pós-parto. Por fim, as práticas do parto podem variar nas comunidades Munduruku e são passadas de geração em geração. Até mesmo depois do nascimento do bebê, as mulheres com sabedoria permanecem orientando no pós-parto seguindo com as crenças estabelecidas durante anos na cultura. Por: Dhemily
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Um começo, um meio e um traço A arte indígena, formada por símbolos que são sagrados ou marcas de identidade de um povo, não representa apenas algo do objeto fisicamente. Em seu artigo O grafismo e significados do artesanato da comunidade Guarani da Linha Gengibre, 2015, publicado pelo departamento de História da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Alexandrina da Silva apresenta que o grafismo tem a função de informar às pessoas que não conhecem a história cultural, religiosa, os ritos e os mitos dos indígenas. Por exemplo, ao trançarem os cestos, os guarani, transformam o elemento morte em elemento vida. Ao conferirem a esses cestos uma utilização sagrada, eles estão devolvendo à vida sua pureza original. Eles estão elevando a morte à dimensão da vida. Por isso, entender e disseminar esses símbolos é o que faz a cultura seja perene. A partir disso, em entrevista ao Ateliê Amazônico, Ana Carolina Jaguatirica, fotojornalista, por meio do Instagram, afirmou que o grafismo sempre esteve presente em seu entorno. Na margem do Rio Arapiuns, em Santarém, a oeste do Pará, onde morava na sua infância, ela comenta que por estar na região e ter a bisavó indígena-peruana pôde ouvir e compreender a magnitude dos símbolos dentro da própria comunidade. É importante destacar que a família e os amigos puderam então compartilhar os ensinamentos de sua cultura, como seu tio que, posteriormente, se aproximou de comunidades indígenas pelo projeto saúde e alegria, uma inciativa sem fins lucrativos que surgiu em 1987 na Amazônia brasileira trazendo para Ana, assim, um laço cultural intenso como privilégio com suas raízes. Dessa maneira, Ana buscou aprofundar seu estudo com livros e até documentos no início da sua consciência étnica. Ela exprime: “Quando eu tinha uns 15, 16 anos, peguei um livro sobre grafismos que tinha na minha casa, que a minha mãe tinha. Nem lembro o nome. Era tão velhinho que não tinha nem capa; era um impresso”. Uma declaração sentimental, que mostra a relevância de poder conhecer suas raízes dentro de suas vivências, para assim buscar em fontes científicas como artigos e livros. Assim, percebemos os privilégios dessa interação familiar. Na visão não-indígena, o grafismo é simplesmente entendido como uma linguagem visual, isto é, para pessoas de fora da cultura indígena representa somente a beleza e a decoração. Alexandrina, ainda em seu artigo, explicita que isso acontece porque não conhecem que neles estão uma rica e diversa sabedoria e conhecimento dos anciões. Compreendemos o privilégio que é poder ouvir histórias de ancestralidade e ter referências dentro de casa, com a própria família, o que evidencia a credibilidade da diversidade cultural presente na família brasileira, além de incentivar a disseminação dos conhecimentos sobre grafismos.
Por: Anna Renata Carvalho A cultura indígena é de grande valor cultural brasileiro: através de seus idiomas nativos, é possível que cada grupo étnico registre ao longo da história suas próprias tradições religiosas, músicas, lendas, dentre outros. Atualmente, há cerca de 170 línguas indígenas no Brasil, preservadas como importantes objetos de estudo na área da linguística. Por meio dessa área de estudo, é possível compreender como a cultura indígena influenciou nossa vida cotidiana, desde os tipos de alimentos até as palavras incorporadas à nossa língua e histórias populares (como “Naiá, a lenda da vitória régia”).
No entanto, há uma estimativa de que em 50 ou 100 anos as línguas nativas possam ser extintas. A professora Luciana Storto, do Departamento de Linguística da Universidade de São Paulo, afirma: “Nós perdemos uma grande diversidade e vamos perder mais ainda”. No Brasil, há uma variedade de línguas nativas, em torno de 37 famílias ou subfamílias linguísticas e mais oito línguas isoladas (não relacionadas a nenhuma outra), sendo o macro-jê e o tupi os maiores agrupamentos. Embora a população indígena no país tenha crescido, há cada vez menos falantes dessas línguas. No livro “Línguas indígenas: Tradição, universais e diversidade”, Luciana Storto explica que enquanto o atendimento à saúde e à alimentação tem melhorado entre os povos indígenas, o preconceito histórico com relação a essas populações dificulta sua inclusão, e os fazem acreditar que o abandono de suas terras, seja o caminho mais adequado para obtenção de fluência na língua portuguesa, na busca de uma vida melhor. Outro fator que influencia a extinção são os idiomas de transmissão oral, cujo conhecimento é passado de geração em geração. Quando os mais velhos deixam de utilizar determinada língua e as crianças param de aprender, acaba resultando no desaparecimento do idioma. Implementação na tecnologia Uma forma de combater a extinção dos idiomas nativos é a implementação deles na tecnologia. Sandalo coordenou a criação de um corpus digital para a língua indígena. O autor reúne algumas narrativas de povos indígenas, em arquivos sonoros e de texto, trazendo tradução de cada uma das palavras. Seus principais objetivos são servir para pesquisas linguísticas e para uso escolar. “O corpus é também um mecanismo de preservação de línguas”, afirma a coordenadora do projeto. Em 2008, também houve a criação do “Kanhgág Jógo”, o primeiro website totalmente em língua indígena no Brasil. Ademais, impossibilitar o uso da tecnologia como ferramenta a serviço da língua indígena aumenta a exclusão de povos nativos impedindo a troca de culturas. Em 2022, o Google Tradutor anunciou a inclusão de mais 24 idiomas nativos, como o guarani, o quíchua e o aimará. Segundo Isaac Caswell, engenheiro de software e pesquisador do Google, os idiomas foram incluídos com uso da tecnologia de modelo neural de inteligência artificial, que aprendeu os idiomas “do zero”. Ademais, foram consultados diversos representantes de várias comunidades para aperfeiçoar padrões linguísticos utilizados no algoritmo do Google Tradutor antes da liberação. Em suma, tem-se a conclusão de que embora tenha uma estimativa de que as línguas nativas desapareçam no tempo de 50 ou 100 anos, medidas já estão sendo tomadas por pesquisadores, como a inclusão de línguas indígenas em livros escolares a dicionários, de sites em idiomas indígenas a corpus linguísticos digitais. Com isso, espera-se a preservação da cultura de diversos grupos étnicos e um mundo mais inclusivo. REFERÊNCIAS MANSUR, GABRIEL. Google Tradutor inclui 24 novos idiomas, entre eles o guarani; entenda o motivo. oliberal.com. 11 mai 2022. Disponível em: <https://www.oliberal.com/curiosidades/google-tradutor-inclui-24-novos-idiomas-entre-eles-o-guarani-entenda-o-motivo-1.533885>. Acesso em: 12 fev. 2023. VERGANI, ARTHUR. Pela sobrevivência das línguas indígenas. pesquisaFAPESP. Edição 273. 13 mar. 2019. Disponível em: <https://revistapesquisa.fapesp.br/pela-sobrevivencia-das-linguas-indigenas/>. Acesso em: 12 fev. 2023. Por: Isabelle Cristine Furtado Assunção Apesar de contemplada na lei, a escolarização indígena ainda enfrenta obstáculos, pois, exige o comprometimento de políticas públicas específicas para esse fim A educação escolar indígena é uma forma de educação básica que garante aos povos indígenas e às suas comunidades e populações o acesso à informação, ao saber-fazer técnico e ao conhecimento científico das sociedades indígenas e não indígenas, bem como o resgate e a reafirmação de suas memórias históricas e de suas identidades étnicas.
Historicamente, a educação indígena era realizada pelas respectivas comunidades, em que o conhecimento da cultura indígena era repassado a partir da configuração das tradições e dos costumes dos povos, com participação ativa dos anciãos e dos pajés. As escolas convencionais, destinadas aos não-índios, não forneciam conhecimento sobre as culturas indígenas ou o faziam por meio de folclorização, exotismo e romantismo do indígena. Também tentavam integrar os alunos à sociedade, desconsiderando suas culturas e cosmologias. A fim de encontrar formas de integrar essa população ao sistema educacional, sem abrir mão da cultura indígena, pautaram discussões sobre as diferenças entre educação escolar indígena e escolarização indígena. A principal forma de educação escolar indígena é a Educação Básica desenvolvida por meio de sistemas educacionais para comunidades indígenas e leva em consideração tanto o conhecimento indígena quanto o conteúdo não indígena. Como resultado, os alunos aprendem na escola sobre sua cultura e conhecimentos gerais, aprimorando sua preparação e garantindo seu direito à educação. Para atender às necessidades educacionais desses povos e manter sua identidade, foi criada no Brasil a educação escolar indígena, para que não precisassem se desvincular de sua cultura para receber uma educação. Para respeitar a ancestralidade e a cultura, essa população, que no Brasil compreende mais de 250 povos, precisa receber uma educação de qualidade, de acordo com o principal objetivo da Educação Escolar Indígena, que é assegurada na Constituição Federal Brasileira de 1988. Para atingir esse objetivo, O MEC e a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) propõem as seguintes ações: • Formação inicial e continuada de professores indígenas de nível médio (Magia Indígena). • Formação de Professores Indígenas em Nível Superior (licenciaturas interculturais). • A criação de materiais instrucionais especificamente em línguas nativas, línguas bilíngues ou português. Com o apoio financeiro do MEC, livros, panfletos, vídeos, CDs, DVDs e outros materiais elaborados por professores indígenas são publicados e entregues às escolas indígenas. • Apoio aos sistemas educacionais em nível político e educacional para aumentar a oferta de ensino médio em terras indígenas. • Apoio ao Controle Social Indígena. Programas de capacitação para ajudar lideranças e professores indígenas a compreenderem seus direitos e exercerem o controle social sobre os mecanismos de financiamento da educação pública. • Auxílio financeiro para construção, reforma ou ampliação de escolas indígenas. Para a realização da Educação Escolar Indígena, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) recomenda a utilização dos seguintes princípios pedagógicos com referenciais específicos: currículos interculturais, bilíngues e bilíngues; sistemas proprietários de ensino e aprendizagem; conhecimento indígena e conteúdo universal; e o ensino da língua indígena como primeira língua. Em entrevista ao Ateliê Amazônico, o indígena Puré Juma Uru-Eu-Wau-Wau, residente na Terra Indígena Juma, em Canutama, município no sul do Amazonas, conta sobre os obstáculos que a educação escolar indígena ainda enfrenta: “Os obstáculos que a educação escolar indígena enfrenta são a falta de estrutura, falta de olhar os alunos, e dos materiais didáticos para aumentar o conhecimento do aluno". Puré também comenta sobre a importância da educação escolar indígena para o futuro dos jovens: "A importância da educação escolar indígena é uma grande importante experiência para os jovens indígenas entender e garantir os seus direitos violados, e buscar melhorias na aldeia com a sua formação técnica profissional". Uma educação de qualidade, que respeite e preserve a cultura do indivíduo, pode ser oferecida por meio da educação indígena, que considera toda e qualquer população do país como tendo direito à diversidade cultural do país. Essa abordagem educacional atende às necessidades educacionais da população indígena, que totaliza mais de 800 mil indivíduos no país, além de contribuir para a declaração da própria identidade étnica, a valorização da língua e dos costumes, e tornar o conhecimento universal e a tecnologia moderna acessíveis para o benefício das comunidades, bem como garantir a autonomia dos povos indígenas. Por Laura Santiago Dentre os rituais indígenas de iniciação, um dos que mais se destaca é o das formigas tucandeiras Habitantes situados no estado do Amazonas entre os municípios de Barreirinha, Maués e Parintins, os Sateré-Mawé constituem um grupo da família linguística Tupi-Guarani. O primeiro nome - Sateré - quer dizer "lagarta de fogo”, referência ao clã mais importante dentre os que compõem essa sociedade, aquele que indica tradicionalmente a linha sucessória dos chefes políticos. O segundo nome - Mawé - quer dizer "papagaio inteligente e curioso”. O Ritual das Tucandeiras, um dos acontecimentos mais significativos para o povo Sateré-Mawé, é a iniciação masculina onde jovens, para provar a força e a coragem, devem colocar as mãos dentro de luvas chamadas de “saaripé”, que são confeccionadas com palhas artesanalmente e adornadas com penas de arara. No interior das luvas são colocadas mais de 100 formigas silvestres denominadas “tucandeiras” ou “tocandiras”, que são presas entre seus traçados de palha. O jovem que participa do ritual não deve gritar ao sentir as picadas das formigas nem demonstrar sofrimento. Para Sandy Yusuru, uma jovem indígena Sateré-Mawé, o ritual é importante não apenas para preparar os meninos à vida adulta, mas também funciona como uma vacina que irá aumentar a imunidade do corpo. "A importância do ritual da tucandeira é a passagem do menino para a vida adulta. É importante, pois prepara o menino para ser um bom caçador, preparando-o para a vida adulta, sem contar que a ferrada da tucandeira é como uma vacina, assim, aumenta a imunidade do menino e faz com que ele seja forte e saudável para ajudar na comunidade”, disse Sandy Yusuru, em entrevista ao Ateliê Amazônico, por meio da plataforma Instagram na sexta-feira (30). P: Qual é o significado da dança durante esses ritos? Sandy Yusuru: A abertura do ritual é comunicada por cantos e danças, em que "os cantos são cantados somente pelos mais velhos e acompanhados pelos mais novos, e as danças são abertas a qualquer um, sendo atividades que não cessam". Os jovens submetidos ao ritual devem efetuar movimentos corporais específicos com os pés, as mãos e o corpo como um todo, e, às vezes, recebem o auxílio do condutor do ritual e de alguns dos demais participantes. Nos pés há acessórios sonoros, um tipo de chocalho ou maracá é fixado pouco abaixo do joelho direito. Assim que as formigas começam a morder, o jovem começa a desferir golpes com a sola do pé direito no chão. A dança é composta de um único passo que é repetido simultaneamente por todos, onde somente tem finalização após o iniciado completar o círculo no centro da aldeia. Os passos para a frente, para trás e para o lado são movimentos coletivos que podem ir para um lado ou para o outro, dependendo do que for determinado pelo comandante. Além disso, a dança representa um coletivo unido e preparado. "Os rituais acontecem nas aldeias nos meses de abril e novembro, são os meses que mais acontecem as festas para o ritual".
Por: Laura Santiago Projeto para exploração de potássio no Amazonas gera controvérsias Em 2009, a mineradora Potássio do Brasil, controlada pelo banco canadense Forbes & Manhattan, iniciou suas atividades perfurando poços e expandindo seus trabalhos para as áreas próximas a reserva indígena de Autazes, município a 110 km de Manaus. Mais tarde, a mineradora foi acusada de coagir indígenas a venderem os seus terrenos, alguns indígenas relataram que a mineradora chegou a oferecer R$900,00 para explorar as suas terras e ameaçaram aqueles que se recusaram a vender. No dia 29 de março desde ano, representantes do Ministério Público Federal (MPF) e da Justiça Federal do Amazonas realizaram uma inspeção na região e concluíram que a mineradora pressionou e coagiu indígenas e ribeirinhos para que suas terras fossem vendidas, e os moradores da reserva tiveram o acesso às suas antigas residências impedidas. A inspeção do MPF identificou cerca de 33 perfurações sem autorização nas terras indígenas Jauary, em Autazes, terras essas que foram reconhecidas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em 2008. O estudo de exploração feito pela Potássio do Brasil, mostra que as atividades da mineradora podem causar danos como: alteração da qualidade da água, fuga de animais, aumento populacional, especulação imobiliária, destruição de sítios arqueológicos, entre outros danos. O atual conflito entre a Rússia e a Ucrânia foi usado pelo governo federal para pressionar a aprovação do início das atividades de mineração na Amazônia o mais rápido possível, argumentando que o país não pode ser dependente do potássio da Rússia, já que o Brasil importa essa matéria-prima, que é essencial para o agronegócio. Porém, antes mesmo da guerra entre Rússia e Ucrânia, a Advocacia Geral da União (AGU) enviou uma petição à justiça, com interesse direto em Autazes. Há especulações de que os argumentos da guerra podem ser uma desculpa para acelerar esse processo do empreendimento, porém não há comprovações a respeito disso. Em 2017, a Justiça Federal suspendeu as licenças ambientais da mineradora até que a consulta prévia às 44 aldeias do povo Mura fosse concluída. Em 2019, os Mura prepararam um protocolo de consulta como um guia sobre como querem ser abordados pelo governo, e sobre como querem se organizar para as tomadas de decisão. A pandemia da Covid-19 e as consequentes medidas adotadas, como bloqueio e suspensão de atividades, atrasou essa consulta, tendo a sua retomada em abril de 2022, após a Potássio do Brasil repassar R$1,2 milhão para custear esse processo; quase metade do valor foi usado para contratar consultores da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). O valor foi solicitado pelos indígenas através de uma planilha de custo, a qual foi periciada pela Justiça. Entre os dias 4 e 8 de abril foi realizada uma assembleia convocada pelo Conselho Indígena Mura (CIM) para que pudesse ser feita a deliberação sobre os riscos e os impactos que a mina da Potássio causaria na região, no entanto, os indígenas presentes criticaram que muitos estavam ali apenas para defender o projeto, o que acabou tornando a assembleia um palco para a mineradora. O município de Autazes não é bem desenvolvido, com esgotos a céu aberto, sem infraestrutura viária, alta taxa de desemprego, e, de acordo com dados da Controladoria Geral da União (CGU), dos 40 mil habitantes, mais de 12 mil estão cadastrados em programas sociais do governo federal.
Segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM), as reservas brasileiras de potássio que estão localizadas na Amazônia têm cerca de 800 milhões de toneladas de potássio Segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM), as reservas brasileiras de potássio que estão localizadas na Amazônia têm cerca de 800 milhões de toneladas de potássio. O Ministério da Agricultura reconheceu que o município de Autazes tem potencial para ajudar a suprir a necessidade do Brasil em produção de fertilizantes, e o Governo Federal acredita que a exploração da região poderia suprir até 25% da demanda brasileira. Além da promessa de gerar cerca de 1,6 mil empregos diretos e quase 17 mil indiretos, criação de hospitais, instalação de câmeras de vigilância nas ruas, saneamento básico, melhorias na infraestrutura, escolas, e no fornecimento de eletricidade. O Ateliê Amazônico conversou sobre o assunto com a juíza da Justiça Federal do Amazonas, Jaiza Fraxe, formada em Direito pela Universidade Federal do Amazonas (1991), Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2005) e Doutora em Biotecnologia pela Universidade Federal do Amazonas (2011). Ateliê Amazônico: A exploração de potássio em Autazes traria muitos danos às terras indígenas, por outro lado, seria muito benéfico para a cidade, podendo gerar melhorias na infraestrutura, escolas e até no fornecimento de eletricidade. Existe algum meio termo que possa ser benéfico para os dois lados? Jaiza Fraxe: O debate sobre danos e benefícios ainda está acontecendo. Estudos de Componentes Indígenas (ECI) ainda serão apresentados no processo. Portanto, não podemos ainda afirmar quais serão os verdadeiros danos e se vão ocorrer reais benefícios para a cidade, o Estado e o país. Afirmações “contra” e “a favor” do empreendimento por enquanto são apenas teses utilizadas pelas partes envolvidas. Ateliê Amazônico: O potássio é uma matéria-prima essencial para o agronegócio, e parte dele vem para o nosso país importado da Rússia. A senhora acredita que os argumentos usados pelo governo de que o país não pode ser dependente do potássio da Rússia, principalmente após o início da guerra com a Ucrânia, são uma desculpa para acelerar o processo de exploração? Jaiza Fraxe: A Justiça Federal não trabalha com argumentos políticos. O processo cuida da consulta a povos indígenas afetados, impactos ambientais e licenciamento. Sobre a utilização de silvanita no agronegócio lícito e as políticas econômicas de governo e de mercado não cabe ao magistrado fazer pronunciamento, pois estaria interferindo em poder ao qual não integra. Ateliê Amazônico: Como profissional, qual é a sua principal preocupação em relação aos indígenas? Jaiza Fraxe: Como Magistrada nossa preocupação está relacionada com o nosso dever de cumprir e fazer cumprir a Constituição da República, as leis infraconstitucionais e os tratados internacionais sobre o tema, como por exemplo a Convenção 169 da OIT, que menciona a necessidade de consulta a povos indígenas quando existem grandes empreendimentos que podem agregar suas terras, seus recursos naturais (inclusive hídricos), sua cultura e rituais e seu modo de vida. O Ministério Público Federal do Amazonas começou a acompanhar o caso após o recebimento de informações de que a Potássio do Brasil estava realizando estudos e procedimentos na região sem qualquer consulta com as comunidades indígenas. A realização das consultas nos moldes previstos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) só veio após o MPF/AM levar o caso à Justiça. Com o acordo de consultas assinado, a justiça prevê o prazo de 90 dias para a realização de uma nova audiência de avaliação das propostas, agora com as consultas à comunidade indígena, e a proibição da Potássio do Brasil em buscar contato com membros das aldeias e comunidades ribeirinhas da região, diante de qualquer processo de convencimento ou de instigação de lideranças e membros dos grupos. O descumprimento de qualquer item do acordo pode resultar em uma multa de até R$50 mil por situação identificada. Por Laura Santiago É notório o protagonismo da juventude indígena nos meios digitais. Suas lutas por demarcação vão das terras às telas. A Internet se tornou uma grande aliada para os povos originários. No mundo digital, muitos jovens indígenas têm se destacado, seja divulgando suas culturas, seja defendendo seus direitos. O Instagram e o Tiktok, por exemplo, são plataformas utilizadas para mostrar seus cotidianos e costumes, além de chamar atenção a pautas de grande importância, como a demarcação de terras e o garimpo ilegal. Com quase 200 mil seguidores no Instagram, Tukumã Pataxó faz sucesso com seus vídeos descontraídos respondendo os comentários que recebe, como o de alguém perguntando se era possível se tornar indígena. E ele respondeu: "É sim, pô. É só pedir a Tupã que você nasça de novo". Em entrevista à revista Piauí (c2021), ele explica que gera conteúdo por meio desses comentários, transformando-os em piada. "Assim a pessoa percebe como o pensamento dela é sem noção", explica ele. Nesse caso, o jovem de 22 anos também faz dessas plataformas um meio para combater preconceitos e desfazer estereótipos. "Comecei a segui-lo depois de ver um 'Reels' dele, no meio da pandemia, e, a partir daí,comecei a acompanhar seus conteúdos. O que mais gosto é o fato dele ser tão direto e incisivo na hora de lidar com comentários e/ou atitudes que incomodam tanto ele, quanto outros indígenas", disse o estudante de engenharia do Instituto Federal do Amazonas/IFAM, Lucas Souza. Uma ferramenta de resistência Quem também vem ganhando bastante notoriedade é a ativista indígena Samela Sateré Mawé, que, assim como Pataxó, utiliza as plataformas digitais como ferramenta de resistência. É por elas que a comunicadora divulga atos e manifestos indígenas. Ela se destaca também por descomplicar temas relevantes sobre questões indígenas para o público jovem nas redes sociais, instigando as pessoas a enxergarem os povos da floresta de maneira diferente da descrita nos livros de história do Brasil. A estudante de pedagogia da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Andresa Travassos, conta que passou a valorizar mais a cultura dos povos originários quando começou a consumir os conteúdos de Samela e após ter contato com outras pessoas indígenas, na universidade. "É muito importante entender mais sobre os movimentos que eles fazem, sobre suas identidades e lutas, além da questão do preconceito relacionado ao uso de telefone, que é algo bastante comum", expressa a universitária, que finalizou dizendo que o uso dessas novas tecnologias não os faz menos indígenas. Preservação da cultura ancestral E foi fazendo o bom uso dos meios digitais que a jovem indígena Mayra Gomez, mais conhecida como Cunhaporanga, conquistou mais de seis milhões de seguidores no TikTok. Ela viu na plataforma uma forma de aproximar o que a Pandemia isolou ainda mais, o lugar onde mora: a aldeia Tatuyo, localizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) do Tupé, a 30 minutos de Manaus(AM), acessível apenas de barco. Aos 22 anos, Cunhaporanga utiliza o espaço de grande alcance para mostrar e explicar sua cultura. Ela responde perguntas das pessoas que a acompanham, mostra trechos de sua rotina e atua como uma espécie de embaixadora, fazendo uma ponte entre mundos tão próximos, mas ao mesmo tempo tão distantes da realidade brasileira.
Durante conversa com O Estadão, em abril de 2022, ela ressalta que compartilhar a cultura Tatuyo na internet é importante porque pode levar conhecimento para pessoas que tendem a tratar os povos indígenas com estranheza. “É importante para que daqui a dez anos nós ainda possamos estar vivos para contar e continuar mostrando os inossos costumes, nossas histórias e falar das nossas raízes sem medo”, finalizou. Por Raissa Eme A população indígena no Brasil soma 817.963 indivíduos distribuídos em todo território nacional, de acordo com o último censo abrangente, realizado em 2010, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A estimativa sobre o tamanho da população indígena brasileira pode apresentar variações, considerando os povos isolados cuja base de informação dessas etnias exige permanente atualização e esforço de pesquisa sobre elas. Existem no Brasil 114 povos isolados, com 28 grupos confirmados e 86 a confirmar, dados da Fundação Nacional do Índio (Funai). É o maior número de isolados do mundo. No Amazonas, os Katawixi, os Nivarura, os Bujiwa e os povos que residem no Vale do Javari são alguns exemplos. Diversos fatores justificam o isolamento desses grupos. O site oficial da Funai, órgão responsável pela proteção de povos originários em isolamento ou de recente contato, aponta como razões questões relacionadas a autossuficiência social e econômica, doenças, conflitos, e espoliação dos recursos naturais.
No Brasil, a população indígena é protegida por lei. No artigo 231 da Carta Magna, é reconhecida a organização social, os hábitos, os costumes, as tradições e as diferenças culturais dos povos indígenas. É de direito dos povos originários manterem sua cultura e sua proteção é dever do Estado Brasileiro. A Funai é encarregada de garantir aos povos isolados o direito de exercer seus costumes e sua liberdade sem necessidade de contatá-los. (Art.2º, inciso II, alínea "d", Decreto nº 7778/2012). Também cabe ao órgão, monitorar a presença de terceiros em áreas de preservação, onde residem grupos indígenas isolados (art. 7º, Decreto nº 1.775/96). Para melhorar o monitoramento dos povos indígenas em isolamento ou de recente contato, a Funai adquiriu, este ano, rastreadores via satélite. Além do monitoramento e do mapeamento geográfico, os rastreadores também visam à proteção dos servidores do órgão em missão. Os dispositivos também foram destinados a 11 Coordenações das Frentes de Proteção Etnoambiental. Ao longo do ano de 2021, a Fundação investiu R$33,5 milhões em medidas de proteção aos povos isolados. Desde o início da pandemia, já foram realizadas 150 ações de fiscalização territorial, de acordo com o Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Os povos isolados e a pandemia Na fase mais aguda da pandemia de Covid-19, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) realizou levantamento independente de casos de Covid-19 entre indígenas. Foram afetadas pelo vírus 162 comunidades, com 1.299 mortes confirmadas. A dificuldade de acesso a serviços de saúde, assim como condições sociais e econômicas precárias em relação aos não-indígenas, agravou o contágio e a fatalidade dos casos da síndrome gripal. No dia 1ºde abril de 2020, foi confirmado o primeiro caso de infecção pelo novo coronavírus em uma jovem indígena agente de saúde, da etnia Kokama. A chegada do vírus ocorreu devido ao contato com médicos não-indígenas que realizavam atendimentos e já infectados. No Vale do Javari, a Covid-19 alcançou povos como os Kanamari. Entre os primeiros infectados estava o cacique Mauro Kanamari. Os povos originários isolados e de recente contato ainda sofrem com falta de testes para Covid-19 e meios de remoção rápida para os enfermos, segundo relatam líderes indígenas. A escassez de hospitais de média e alta complexidade nos municípios além da capital do Amazonas, é outro fator agravante para os indígenas que adoeceram e adoecem. A pressão do movimento indígena, de organizações e de instituições de apoio aos povos indígenas fez com que 907.200 doses de vacina, das primeiras 3 milhões que chegaram ao Brasil, fossem destinadas aos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs). A vacinação teve início em 19 de janeiro de 2021, de acordo com o relatório oficial da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), de 2022. Leitos de média e alta complexidade foram reservados às populações indígenas em 59 Estados pelo país. Também houve a criação da Equipe de Resposta Rápida, com logística, kits de insumo e equipamentos de proteção individual, de acordo com a SESAI. A luta Além da pandemia, os povos originários isolados e de recente contato enfrentam outro desafio: a defesa de suas terras. A invasão das terras indígenas teve alta de 137% em dois anos do governo atual, de acordo com o Conselho Indígena Missionário (CIMI), divulgado no relatório de outubro do ano passado (2021). As estatísticas de assassinatos de indígenas também sofrem alta. No ano de 2020, a SESAI divulgou 182 ocorrências. Os casos de desrespeito às demarcações de terras indígenas ocorrem devido à redução da fiscalização, e de episódios como a prorrogação por seis meses da portaria que protegia o território Piripkura, o que pode ocasionar a dizimação da etnia. Desse modo, a própria Fundação Nacional do Índio se posiciona a favor da política anti-indígena do governo. Os povos originários são aqueles que carregam consigo a verdadeira história dessas terras, e guardam com sangue todo o legado de seus ancestrais. São tios, avós, filhos e pais, que possuem as terras que habitam por direito constitucional, e resistem pelas próximas gerações. Por: Carol Veras. O linhão de Tucuruí foi projetado como uma obra do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal para ser uma rede de transmissão elétrica com mais de 1.800 km de extensão que ligará a Usina Hidrelétrica de Tucuruí (UHE), localizada no rio Tocantins (PA), a Macapá (AP), Manaus (AM) e Boa Vista (RR), passando pela terra indígena Waimiri Atroari. Linha do tempo da Usina Hidrelétrica de Tucuruí As obras da UHE de Tucuruí começaram em 24 de novembro de 1974 pelas empreiteiras Camargo Correia e Queiroz Galvão. A construção da barragem de Tucuruí afetou profundamente as populações indígenas e pequenos agricultores ribeirinhos. Segundo o pesquisador Koifman (2001), o processo de implantação dessa usina é um dos mais estudados, pois inundou 2.430 km², atingindo diretamente, por alagamento, as áreas indígenas Asuriní, Gavião (que se autodenominam Parkatejê), Suruí, Parakanã e Xikrín, e também as áreas Guaj)ará e Krikatí, pela construção das linhas de transmissão. A UHE de Tucuruí teve sua inauguração oficial em 22 de novembro de 1984. Mas foi somente em dezembro de 1992 que a primeira etapa da obra foi concluída. Em 1998, foi iniciada sua obra de expansão, caracterizada pelo início das obras civis na (Cidade de Tucuruí, Estado do Pará). Em 1999, a ligação dos municípios à rede de energia de Tucuruí em período de eleições demonstra também a politização do processo de eletrificação. Em 2008, a UHE de Tucuruí teve a segunda etapa concluída. Em dezembro de 2010, começou a construção do Linhão, com previsão de término de dois anos. Em 1˚ de abril do ano seguinte 2011, a montagem da primeira torre do Linhão de Tucuruí foi concluída no trecho entre Oriximiná (PA) e a Subestação Engenheiro Lechuga em Manaus (AM), porém a linha de transmissão de Tucuruí logo se tornou um foco de conflitos, impactos e problemas socioambientais. Os anos de 2011 e 2012 foram marcados por inúmeros conflitos judiciais e extrajudiciais envolvendo a construtora do Linhão, o Ministério Público Federal do Amazonas (MPF/AM) e as organizações de moradores da região em diferentes momentos. Em janeiro de 2014, o Ibama autorizou a licença de operação do último trecho da linha de transmissão de Tucuruí, que liga o Amapá ao Sistema Interligado Nacional (SIN), porém, no fim da linha de transmissão, não havia infraestrutura pronta para realizar o escoamento de energia até as casas, o que acabou frustrando a operação. O conflito chega aos Waimiri Atroari O MPF/AM interveio em uma das etapas do licenciamento, em novembro de 2014. A linha que estava em processo de licenciamento iria de Manaus a Boa Vista e de acordo com alegações do MPF, esse traçado afetaria negativamente a terra indígena Waimiri Atroari. Na época, o procurador federal da república, Jorge Medeiros, afirmou ao portal A Crítica (2014) que a ação do MPF tinha a preocupação de não permitir que houvesse violação dos direitos das comunidades indígenas. “Queremos que outras soluções sejam propostas, alternativas que não violem os direitos dos povos Waimiri-Atroari. Precisamos respeitar os direitos deles e garantir que possam exercer seu modo de vida normal, sem mudanças por culpa de um suposto progresso. Não se trata de um favor, mas de um direito das comunidades indígenas que não pode ser violado. Se não agirmos com urgência, teremos consequências irreversíveis naquela área”, declarou o procurador Medeiros. Em janeiro de 2015, o ministro de Minas e Energia, Edson Lobão, enviou ofício ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, buscando apoio do MJ, para que fizessem pressão sobre a FUNAI, a qual era na época, e ainda é, subordinada ao Ministério da Justiça, para que liberassem a licença. A continuidade das obras depende da expedição de licença pela FUNAI, órgão indigenista oficial do Estado brasileiro. E, desde então, esse impasse de licenciamento vem se prolongando, até que, em 2019, ao assumir a presidência da República, Jair Bolsonaro, em uma de suas primeiras manifestações como presidente, sinalizou a favor da continuidade das obras do linhão no trecho Manaus–Boa Vista, o que pode ser considerado como sua maior e mais controversa intervenção na Amazônia até agora. Porém, segundo o portal BBC NEWS│BRASIL (20/06/2019), representantes dos Waimiri Atroari dizem que os indígenas não foram ouvidos previamente sobre as obras em seu território. Argumentam que o traçado foi definido baseado em um sobrevoo na área, sem consultar os indígenas, o que é exigido por uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. Em um documento divulgado em 2018, o povo Waimiri Atroari diz que as reuniões que tiveram com o governo nunca foram para consultá-los, parecia sempre uma imposição do governo. No segundo semestre de 2021, após recorrentes conflitos judiciais gerados pelo modo inadequado que o governo vinha consultando a esse povo, os Waimiri Atroari decidiram requerer o pagamento de pouco mais de R$133 milhões como compensação pelos prejuízos irreversíveis, que esse empreendimento poderá causar a seu território, seu modo de vida e cultura. Sobre o valor requerido como compensação, a Justiça afirmou que “chega a ser insignificante diante do lucro que será gerado pela exploração da matriz energética”, citou ainda, como exemplo, que o lucro líquido anual de 2020 da empresa Amazonas Energia foi superior a R$ 500 milhões, conforme dados da própria empresa. No mês seguinte à apresentação da proposta de compensação dos Waimiri Atroari, a empresa Transporte Energia encaminhou à FUNAI um documento discordando dela. No entanto, conforme apuração do MPF, apesar da discordância, a FUNAI, por meio da Coordenação Geral de Licenciamento Ambiental, encaminhou ao Ibama um documento informando indevidamente que o processo de licenciamento ambiental, incluindo o processo de consulta, havia sido devidamente realizado, dando a entender que os indígenas haviam concordado com a continuidade do empreendimento.
Segundo um artigo veiculado no site do conselho Indigenista Missionário – CIMI e escrito pelo indigenista Egydio Schwade, este empreendimento é mais uma mentira contra o povo Waimiri Atroari, aludindo ao projeto da BR-174 concebido e executado pela ditadura militar, que por sua vez, à época, justificou sua construção pela necessidade de ligar Manaus (AM) a Boa vista (RR), porém, os documentos que originaram a BR-174, comprovam que a obra visava as jazidas minerais da terra desses índios. Deixando claro que o objetivo era outro. Desta feita, o objetivo principal do Linhão de Tucuruí não é abastecer o Estado de Roraima, já que Roraima não precisava estar sofrendo de falta de energia. A solução mais fácil para esse problema seria o Brasil normalizar as relações diplomáticas com o governo da Venezuela, que foram suspensas pelo governo Bolsonaro em submissão aos interesses dos Estados Unidos. O Linhão de Guri/Venezuela ainda existe e já funcionou muito bem, ao trazer energia mais barata do país vizinho para Roraima. O povo Waimiri Atroari continua sendo um dos povos indígenas que mais resistem a tentativa de invasão de seus territórios por multinacionais como desde a década de 1980, a Casa da Cultura do Urubuí – CACUÍ localizada em Presidente Figueiredo/AM, vem denunciando. Segundo declaração da representante do CACUÍ Stefany Menezes, em entrevista ao Ateliê amazônico, “este é mais um episódio histórico em que se ignora a voz do povo Waimiri Atroari, seus desejos, sua cultura e em suma sua existência. E que nenhuma compensação monetária é suficiente frente as perdas que o empreendimento trará”. É de extrema importância que se tenha em mente, que o povo Waimiri Atroari é, no momento, o principal alvo do governo Bolsonaro, como detentores de um enorme potencial mineral em suas terras. Não os deixemos sós nessa luta. Autor: Rodrigo Silvério Fontes: Linha de transmissão de Tucuruí é foco de conflitos, impactos e problemas que chegam a três estados. MAPA DE CONFLITOS INJUSTIÇA AMBIENTAL E SAÚDE NO BRASIL, FIOCRUZ. Disponível em: http://mapadeconflitos.ensp.fiocruz.br/conflito/linha-de-transmissao-de-tucurui-e-foco-de-conflitos-impactos-e-problemas-que-chegam-a-tres-estados/#fontes. Acesso: 05/01/2022 KOIFMAN, Sergio. Geração e transmissão da energia elétrica: impacto sobre os povos indígenas no Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 17(2):413-423, mar-abr, 2001. Disponível em: http://goo.gl/9L0neb. Acesso: 26/01/2022. BLINK, Cintia. MPF-AM exige anulação do edital do Linhão de Tucuruí por afetar terras indígenas. A Crítica, 19 nov. 2014. Disponível em: http://goo.gl/PLPoKJ. Acesso: 27/01/2022. Fellet, João e Rossi, Amanda. Indígenas brigam para serem ouvidos sobre obra prometida por Bolsonaro. BBC News Brasil, São Paulo, 19 junho 2019 atualizado 20 junho 2019. Disponível em: https://bityli.com/MHeLE. Acesso: 27/01/2022. Obras do Linhão só poderão iniciar após pagamento de compensações. Folha de Boa Vista, Roraima, 28/12/2021. Disponível em: https://bityli.com/aTWYV. Acesso: 15/01/2022 Schwade, Egydio. Linhão de Tucuruí: mais uma mentira contra o povo Waimiri Atroari. CIMI, Amazonas, Brasil, 18/10/2021. Disponível em: https://cimi.org.br/2021/10/linhao-de-tucurui-mais-uma-mentira-contra-o-povo-waimiri-atroari/. Acesso: 04/02/2022 Originários de uma aldeia localizada no igarapé Apituã, o povo Banawá é um dos menos conhecidos e estudados do Brasil. Após anos de invasão nas suas terras por seringalistas e madeireiros, sua declaração como território indígena ocorreu em maio de 1992 e anos depois a região foi demarcada. Possuem forte relação com os Jamamadi, vivendo na mesma região e compartilhando diversos aspectos culturais. História A primeira aldeia dos Banawá era localizada no igarapé Apituã, próximo às margens do Rio Purus. Posteriormente surgiram outras aldeias, incluindo no Igarapé da Lata, por onde, por intermédio dos Jamamadi, era exportada a copaíba, e sendo esse o primeiro contato dos Banawá com a sociedade nacional. Durante a época da borracha, a região do Purus foi ocupada e explorada por diversos seringueiros e trabalhadores não-indígenas, que recebiam incentivos e patrocínios do Estado para o deslocamento e a extração no local, invadindo territórios indígenas que não possuíam amparo algum até então. A invasão violenta ocasionou diversas mortes e expulsões. A população indígena da região do Juruá-Purus, que era uma das maiores da Região Amazônica na época, diminuiu consideravelmente. Aspectos culturais De acordo com Luciene Pohl, Doutoranda e Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal do Amazonas, a distribuição de cerca de 150 Banawás é feita em quatro aldeias. A aldeia principal está instalada no alto do Igarapé Banawá, comportando cerca de 70% da população. As três aldeias restantes contam com uma parcela de 10% da população, cujos moradores são afastados por não seguirem os princípios da aldeia principal: na Aldeia Cachimbo moram dois irmãos que bebem muito, na Aldeia Apituã mora a família de um indígena que matou um parente, na Aldeia Paraíba residem aqueles que se relacionaram com não indígenas, e os que possuem conflitos com os moradores da aldeia principal. Apesar da fixa localização atual, os Banawás têm um passado nômade, e se deslocavam de tempos em tempos na região entre os rios Purus e Piranha, motivados por conflitos entre si e por acusações de feitiçaria. Quando ocorre o falecimento de um Banawá é realizado o enterro dos corpos em sepulturas próximas às aldeias. Há o costume de deixar as armas e oferecer ao finado alimentos e oferendas durante os dias após o sepultamento, até o momento em que a alma abandone o corpo físico. Além disso, existem dois momentos onde ocorre a exclusão temporária do convívio social na Aldeia: durante a iniciação dos pajés e quando as meninas têm a menarca. A língua Banawá pertence à família linguística Arawá assim como os outros habitantes da região localizada no médio rio Purus: os Deni, Jamamadi, Jarawara, Kanamati, Sorowaha, Hi Merimã, Paumari e Kulina. Os cultos protestantes realizados por missionários ou pelo pastor indígena é feito em Banawá. A Bíblia utilizada na igreja local é uma adaptação ilustrada feita por voluntários da igreja coreana MyungSungChurch. A produção dos Banawás é baseada na agricultura, caça, pesca e coleta. Os produtos que mais são cultivados são macaxeira, banana, abacaxi, pupunha, mandioca e cana de açúcar, com foco na produção de mandioca. Os Banawás possuem notável habilidade de caça, e para isso utilizam ferramentas como arco, flecha e espingarda. Alguns dos animais apreciados para consumo são a anta, o caititu e as aves como arara e nambú. Os produtos mais extraídos nas aldeias são a palha, andiroba, castanha e o óleo de copaíba.
Autora: Beatriz Farias |
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